Se você tiver curiosidade de vivenciar o desabrochar da indústria da maconha em um lugar que conta com a plena legalização e ainda não tem muita regra, vá para a Tailândia. O país passa por isso nesse exato momento, num clima de festa do morango de Atibaia, só que numa escala muito maior e com praia.
Mas vá agora, porque o desenrolar do setor nos próximos meses é incerto. Pelo menos, é isso o que se diz aos 4 ventos desde que Srettha Thavisin, o novo primeiro-ministro e detrator da erva, assumiu o poder, no fim de 2023.
Depois de um 2023 agitado, com negócios de maconha pipocando a cada esquina, o novo governo quer acabar com o consumo recreativo no país, retrocedendo ao status anterior à legalização, em junho de 2022, onde, até então, apenas o uso medicinal com prescrição médica era permitido. Estamos de acordo que direitos conquistados não são, necessariamente, direitos garantidos, mas é muito improvável que a flecha lançada retorne ao arco.
O atual governo pode, sim, legislar agora para impedir o crescimento desenfreado do mercado, piorando os processos burocráticos para conseguir uma licença, aumentando o seu valor, ou mesmo proibindo a concessão de novas autorizações, mas é quase certo que o milhão e meio de licenças para negócios de cultivo ou venda de cannabis concedidas até agora –com valores de R$ 600 a R$ 7.000– seguirão valendo nessa transição.
Muitos empresários preferiram esperar e observar os rumos do setor recém legalizado antes de comprar uma licença, buscando minimizar os riscos jurídicos e financeiros inerentes. Erro crasso. Segundo a antropóloga Luna Vargas, que está na Tailândia estudando esse momento histórico, eles hoje se arrependem por não terem solicitado licenças enquanto ainda era possível; já os que o fizeram a tempo, estão confiantes na escolha que tomaram e têm fé na continuidade dos negócios.
São vários os paralelos possíveis de traçar entre a cannabis na Tailândia e no Brasil, começando pelo clima tropical ideal para o cultivo da planta e a mão de obra barata. Esses são só 2 dos fatores que mais chamam a atenção dos empresários estrangeiros do ramo, que, no dia seguinte ao anúncio da legalização, já começavam a desembarcar no país que, naquele momento, virou trend do setor mundial –e ainda é.
“Óbvio que preferiram montar cultivos na Tailândia a no Canadá, onde, apesar de legalizado, o clima é péssimo e a mão de obra é cara”, explica Vargas, que também acompanhou de perto o início do desenvolvimento do mercado legal canadense alguns anos atrás. Ademais, vale esclarecer que a chegada de estrangeiros não foi uma invasão desrespeitosa para com os profissionais locais, até porque só está permitido contratar 1 estrangeiro a cada 5 contratados tailandeses.
Tailândia e Brasil também têm em comum a predisposição para movimentar bilhões de dólares desde o início. Lá, até meados de 2023, o mercado da maconha movimentou US$ 1,3 bilhão. Além disso, há também o enorme potencial de exploração do turismo canábico, que, no país asiático, já vem sendo feito com louvor: nas barraquinhas de praia, além do coco verde, da cerveja gelada e dos petiscos, também agora vendem cigarros de maconha pré-enrolados.
Os spas que oferecem massagem com óleo de cannabis e os mais de 7.000 dispensários de venda da erva e outros negócios canábicos espalhados pelo país fizeram o turismo do país crescer ainda mais, sobretudo com cidadãos de outros lugares da Ásia, especialmente os chineses e os australianos.
A Tailândia é uma festa da maconha desde junho de 2022, quando se tornou o 1º país da Ásia a legalizar a erva. Foi uma festa de pura ostentação, que começou com o governo distribuindo 1 milhão de mudas da planta para que os cidadãos plantassem para o seu próprio consumo. Daí em diante, cresceu tal como a franquia de mercados Oxxo no Brasil.
A tal festa, que rolava solta havia 18 meses, agora tem um vizinho chato, com o qual será preciso negociar. Não é que a festa vá acabar, mas já não vai dar pra fazer tanto barulho depois das 22 horas…
Em outras palavras, chegou a hora de regulamentar o oba-oba. Estabelecer, por exemplo, a quantidade permitida de maconha em voos internos. Hoje, qualquer pessoa pode voar com qualquer quantidade da substância. A regulamentação é um processo natural em todos os mercados legalizados da maconha no mundo. Não representa, necessariamente, um retrocesso terrível, como acham alguns. É um momento de revisão e definição de regras que, até então, quase inexistiam.
Os mercados globais de cannabis que observam o processo da Tailândia têm muito a aprender. Talvez, a maior lição seja: quem entrar 1º pode garantir posição privilegiada quando a nova indústria finalmente se assentar. Por isso, é bom que empresários e investidores brasileiros que pretendem entrar no ramo da cannabis e ainda não deram o salto reflitam sobre esse timing. Será preciso estarem atentos, com operação preparada e, preferivelmente, já lançada para agarrar a oportunidade assim que ela surgir.
Isso pode acontecer amanhã ou depois, sem exagero no termo, com a divulgação do entendimento do STJ (Superior Tribunal de Justiça) sobre o mérito do cultivo de cannabis em território nacional para fins industriais ou medicinais. Pode parecer que não, mas o Brasil já está em pleno processo de legalização de todos os usos, inclusive o recreativo. Quem ainda não percebeu isso está marcando touca.
Poder360