Duas bordadeiras de Timbaúba dos Batistas, pequena cidade do interior do Rio Grande do Norte, assistiram da primeira fila à cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Paris 2024 nesta sexta-feira (26) e vibraram com o desfile da delegação brasileira no Rio Sena.
Salmira de Araújo Torres Clemente e Jailma Araújo representaram em Paris o grupo responsável pelos bordados que estamparam as jaquetas jeans do uniforme da delegação brasileira.
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As duas foram convidadas nesta sexta-feira – quando já estavam em Paris – para acompanharem o desfile de abertura da primeira fila. Elas vibraram e se emocionaram com o momento.
“O principal segredo é que esse bordado representa, em parte, a cultura do nosso município de Timbaúba dos Batistas. Ele passa de geração para geração e sempre nos foi ensinado pela mãe ou por alguém da família mais próximo”, contou a bordadeira Salmira, que tem 68 anos e trabalha com isso há mais de 50.
“A gente carrega no coração a arte de bordar e, a forma como ela é repassada, aumenta a nossa responsabilidade pela perfeição do trabalho. Costumo dizer que nosso trabalho tem o tempero do amor, porque a gente aprendeu com nossas mães”, completou.
As outras bordadeiras se reuniram na própria cidade de Timbaúba dos Batistas para assistirem à abertura da Olimpíada de Paris. Elas são responsáveis pelas artes estampadas nos uniformes do Brasil.
As trabalhadoras e as famílias se reuniram no prédio do centro de convivência da cidade para acompanhar a cerimônia em um telão. O grupo se juntou para presenciar a delegação brasileira e ver as artes que produziram sendo expostas para todo mundo.
A bordadeira Valdineide Dantas, de 34 anos, relatou o momento de alegria quando a delegação brasileira passou de barco no Rio Sena vestindo o uniforme com as artes.
“Sentimento é de gratidão a Deus por mais essa conquista do nosso bordado. Estamos todas muito emocionadas por viver esse momento”, comemorou Valdineide.
Duas bordadeiras foram acompanhar a abertura das Olimpíadas em Paris, em uma comitiva formada pelo governo do Rio Grande do Norte. Já na cerimônia, elas foram convidadas para assistir o desfile na primeira fila.
“Isso é um orgulho imenso pra todas as bordadeiras de Timbaúba dos Batistas”, comemorou a bordadeira Iranilda Batista.
Nas últimas semanas, várias postagens e comentários foram publicados nas redes sociais com críticas ao uniforme e com comparações com a vestimenta de delegações de outros países. Sugiram até modelos alternativos desenhados por estilistas para o Brasil. Nesta quarta (24), o presidente do COB, Paulo Wanderley, também rebateu as críticas e disse que “Não é Paris Fashion Week”.
Em entrevista ao g1, a coordenadora de Desenvolvimento Econômico e Artesanato do Município e presidente da Cooperativa das Mãos Artesanais de Timbaúba dos Batistas, Jailma Araújo, ressaltou a arte feita pelas bordadeiras. “Temos muito orgulho nosso trabalho”, resumiu.
Para a bordadeira Alcilene Medeiros, de 44 anos, que participou do bordado das artes nas jaquetas da delegação, alguns comentários são pesados e “vão além da conta”. Ela disse que, pessoalmente, teria feito o modelo com algumas mudanças, mas acredita que também haja preconceito nas críticas diante do uniforme ter sido produzido no Nordeste.
Alcilene relatou que as críticas têm afetado as bordadeiras e também as pessoas que admiram o trabalho. Apesar disso, disse que tem visto comentários que também valorizam os bordados.
“Todos ficam um pouquinho chateados em relação aos comentários, mas de qualquer forma a gente sabe que não é com o bordado esses comentários horrorosos”, disse.
“De toda forma a gente fica um pouquinho triste, porque isso prejudica também o nosso trabalho, nosso artesanato, nosso amor que foi colocado ali naquelas peças”.
A opinião é compartilhada pela bordadeira Valdineide Dantas, de 34 anos. “Me deixa triste de uma certa maneira, porque o trabalho desenvolvido pelo bordado foi feito com muito amor. Muita dedicação”, falou.
“Não falo só por mim, mas pelas outras bordadeiras que se empenharam vários meses bordando araras, tucanos e onças pra esse projeto”.
Bordadeiras de Timbaúba dos Batistas , cidade de pouco mais de 2,3 mil habitantes no interior do Rio Grande do Norte, foram as responsáveis por confeccionar as artes das roupas que serão utilizadas pelos atletas do Brasil na abertura dos Jogos Olimpícos de Paris.
O trabalho foi feito nas jaquetas que serão usadas pela delegação, tendo sido bordadas imagens que representam a fauna brasileira, como tucanos, araras e onças. Tudo foi feito de forma artesanal – peça por peça – pelas mãos das trabalhadoras da região Seridó do RN, polo desse tipo de atividade no estado.
Esse, no entanto, não é o primeiro trabalho de relevância feito pelas bordadeiras, que já haviam confeccionado o vestido de casamento da primeira-dama Janja, em 2022, e a roupa que a socióloga usou na posse do terceiro mandato de Lula como presidente, em janeiro de 2023.
As bordadeiras visam ganhar mais visibilidade e romper novas barreiras ao mostrar a arte delas para vários países do mundo no evento.
Segundo a Associação das Bordadeiras de Timbaúba dos Dantas, fundada em 1984, o trabalho foi feito por 80 trabalhadoras da cidade – que usaram lápis, agulha, goma e máquinas de costura. O trabalho inicialmente havia sido iniciado por 18 profissionais, mas aumentou devido à demanda.
Foram, ao todo, mais de 2.484 peças confeccionadas e entregues em cerca de cinco meses – sendo o último lote em abril.
As bordadeiras de Timbaúba dos Batistas foram as responsáveis por reproduzir os desenhos – que já haviam sido criados pela Riachuelo, empresa fornecedora do uniforme – e depois bordá-los para que fossem enviados à fábrica, onde as artes foram aplicadas nas jaquetas.
Além do prazo curto, outro desafio para as bordadeiras foram os desenhos, segundo a coordenadora de Desenvolvimento Econômico e Artesanato do Município e presidente da Cooperativa das Mãos Artesanais de Timbaúba dos Batistas, Jailma Araújo.
Em média, a criação de uma peça durava até 8 horas, segundo contou a bordadeira Valdineide Dantas.
A presidente da cooperativa, Jaílma Araújo, contou ainda que muitas das bordadeiras tem outras profissões nas quais trabalham durante meio período. Segundo ela, isso foi motivado também por crises pela qual a atividade passou.
“Tem aquela bordadeira que passa o dia inteiro em casa, que vive somente do bordado, que é a maioria. E tem aquelas que dividem, trabalham em outra coisa em um período e com o bordado no outro”, disse.
Nos últimos anos, segundo ela, com o apoio do poder público na divulgação e comercialização, “as oportunidades foram aparecendo e o bordado voltou a ser valorizado”.
“Isso motivou as nossas bordadeiras a acreditarem que o bordado é a oportunidade de melhorar a nossa qualidade de vida”, disse.
A bordadeira Jailma Araújo disse que esse momento é “a realização de um sonho” e que aguarda ansiosamente pela abertura. “Todo artesão, todo artista tem o sonho de ver o seu trabalho reconhecido, sendo valorizado”, disse.
“E ter conquistado um trabalho que foi desafiador, pela quantidade e pela importância que tinha esse projeto…ver que foi finalizado, que conseguimos realizar isso, é motivo de muito orgulho pro nosso município, pras nossas bordadeiras e pro nosso estado. É muita felicidade, é emocionante”, completou.
Valdineide Dantas aprendeu a costurar e bordar aos 11 anos de idade com a mãe dela, hoje com 55 anos, que também é bordadeira. A história dela é um exemplo de como a atividade é imprescindível na economia de Timbaúba dos Batistas e como atravessa gerações.
De acordo com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do RN (Sebrae-RN), um terço de trabalhadores da cidade está na atividade do bordado.
“Nossa cidade é muito pequena e a renda principal vêm do bordado. Esse projeto ajudou várias famílias. O bordado é minha única fonte de renda”, contou a bordadeira Valdineide Dantas.
Muitas delas, assim como Valdineide, trabalham com a atividade na própria casa. Ela contou que a maioria das peças confeccionadas para as Olimpíadas passou pelas mãos dela, que foi responsável por colocar o desenho dos animais no tecido para depois serem bordadas por outras colegas – e por ela mesma. A última etapa foi a aplicação nas jaquetas – passo feito na fábrica da Riachuelo.
A avaliação final ficou por conta da presidente da Cooperativa das Mãos Artesanais de Timbaúba dos Batistas, Jailma Araújo.
“Eu avaliava cuidadosamente os pontos e as cores. Todas as peças precisavam ficar exatamente iguais nas cores e pontos e principalmente a expressão facial o mais realista possível”, contou.
Além das jaquetas jeans com os animais bordados, os uniformes também são compostos por saia, calças e camisetas com as cores da bandeira do Brasil. Tudo feito em fábrica e com matéria-prima reciclável.
g1 RN